CordeiroBIZ

Disseminação de resultados para a ovinocultura: Brasil

Inspiração é a palavra que movimenta as energias da equipe CordeiroBIZ na saga pela disseminação da ovinocultura de resultados no Brasil. Dessa forma, iniciamos o projeto de transferência tecnológica em meados de 2011 ao promover a vinda do produtor neozelandês Robin Hilson, do complexo de fazendas conhecidas nacional e internacionalmente por One Stop Ram Shop, que visitou junto a equipe e parceiros mais de 8 mil quilômetros do território brasileiro. Robin Hilson, no auge de seus 70 anos (mais de 50 como produtor de ovinos), tem nos motivado pela sua paixão ímpar e desprovida de qualquer ego pela ovinocultura:

“Não acredito que o potencial produtivo do Brasil seja uma ameaça ao nosso mercado. Acredito sim, que podemos guiá-los por meio dos nossos exemplos para que possam se tornar mais eficientes e, desta forma, ajudar-nos a alimentar o mundo.”

Exemplificando este depoimento, a One Stop Ram Shop segue como referência mundial em produção de genética ovina. Diversos países como o Irã, Geórgia, Reino Unido e Brasil agregaram programas para estruturar seus sistemas produtivos focados em alcançar a mesma eficiência. A CordeiroBIZ foi desenvolvida por nós, profissionais brasileiros e neozelandeses, como a ponte Brasil e Nova Zelândia para capacitar e transferir as tecnologias para aqueles que acreditam na proposta.

Com o objetivo de motivar cada vez mais os pecuaristas e profissionais da ovinocultura, lançaremos algumas experiências adquiridas pela nossa equipe na One Stop Ram Shop. Qual é o processo de decisão para mudar a realidade da ovinocultura em seu país?

Apresentamos a vocês o artigo na íntegra escrito por Robin Hilson ao editorial do jornal de notícias agropecuárias Farm Focus da ilha norte da Nova Zelândia, sobre a experiência dele ao visitar o Brasil em 2011. Inspire-se!

“É, absolutamente, INACREDITÁVEL.” Por Robin Hilson, One Stop Ram Shop, Hawke’s Bay – Editorial Farm Focus, Nova Zelândia

Eu já viajei por muitos países e acompanhei de perto criatórios ovinos na Dinamarca, Noruega, Finlândia, Alemanha, Reino Unido, Austrália, Canadá, EUA e África do Sul. Nesses meus 50 anos como produtor rural ganhei experiência e senso crítico e como resultado, a OSRS, idealizada por mim, produz genética de ponta que há muito atinge solos estrangeiros nas Américas, África do Sul e Austrália. Genética do nosso país provando resultados mesmo em meio a tanta diversidade.

Sempre fui tachado como ‘ovinocólatra’. Apesar de ser da terra dos kiwis, como qualquer neozelandês com histórico de vida rural que se preze, eu não escondo minha paixão pela criação de ovinos. Eu sei que essa afirmação chega a ser ridícula mas ao pousar em terras brasileiras pela primeira vez, para meu grande contentamento, vi que não estamos sozinhos.

Foram 3 semanas no imenso Brasil em março deste ano que eu, juntamente com minha guia (e ovinocólatra também), percorremos um total de 8700 quilômetros. Minhas únicas duas palavras em português que gravei foram: “Não, obrigado.” Elas foram cruciais contra a tentação que vinha da maravilhosa diversidade de pratos da cozinha brasileira aliada à hospitalidade singular dos brasileiros. Aonde quer que eu fosse, lá estava uma mesa farta e muitos sorrisos e abraços ao meu encontro. Dos mais de 30 países que visitei, o Brasil é de longe o melhor de todos simplesmente por causa do seu povo.

Meu propósito inicial era conhecer a indústria da ovinocultura e descrevê-la aqui, no entanto, como um bom observador e impressionado com as coisas que vi, não posso deixar de contar o que me chamou a atenção durante minha estadia lá.

O Brasil é 30 vezes maior em extensão que a Nova Zelândia e para cada neozelandês existem 45 brasileiros. O país é lindo, diversificado e bastante estimulante. Aves coloridas, répteis e uma grande massa de vida selvagem encheram meus olhos e como um bom zoólogo que sou tive que identificar muitas das espécies de insetos, formigas e cobras com a ajuda da minha câmera (e acabar sendo observado pelas pessoas ao meu redor). Apesar de se ouvir repetidamente sobre a destruição da Floresta Amazônica, é interessante notar que ninguém menciona as vastas áreas de proteção de leitos de rios e áreas de reconstituição da floresta nativa dentro das propriedades rurais as quais as tornam corredores magníficos de vida selvagem e mata crescente. Em toda oportunidade que tenho eu mostro minhas fotos e conto o que eu vi.

As tempestades de chuva no Brasil podem ser devastadoras. É impressionante o volume dos rios que cortam as imensas cidades e áreas aráveis. No entanto, os brasileiros demonstraram não saber o quão valioso esse bem é para eles, deixando esse neozelandês triste ao ver tamanha contaminação por poluição de rios majestosos.

A programação televisiva também é interessante. Não é preciso saber português para perceber que eles adoram suas novelas, mas me surpreendi com a presença de canais exclusivos para mensagens religiosas.

O grafite brasileiro também impressiona, justamente por ser controverso: ora transformando ruas cinzas em lugares cheios de cor, ora piorando ainda mais a frieza dos aglomerados urbanos.

A comida brasileira, ah, a comida brasileira! Seja ela vinda de um posto de gasolina na estrada, de um restaurante no centro da cidade ou mesmo caseira, a comida brasileira é maravilhosa. Uma quantidade incrível de gostos diferentes, de variedades de dar água-na-boca e serem uma grande ameça às medidas de cintura dos visitantes estrangeiros. A carne preparada em churrasqueiras à carvão foi uma das melhores que já provei.

“Não, obrigado!” Chega de comida!

E o café. Amargo e forte, o café brasileiro foi o MELHOR que já provei. Está sendo difícil voltar a acostumar com o nosso.

Em lugar algum desse mundo eu conheci motoristas melhores do que os brasileiros, sejam eles caminhoneiros ou de carro de passeio. A cidade de São Paulo tem a maior frota de carros do Brasil e, desta forma, vocês podem imaginar a concentração de automóveis nas ruas e avenidas gigantescas. Com uma destreza inigualável, como pássaros, os carros davam sinal e cortavam as pistas da esquerda para a direita e vice-versa, indo e voltando fazendo com que aquela massa quase estática de autos pudesse enfim se mover. As motocicletas me surpreenderam também. Inúmeras e barulhentas. Perguntava-me se haveria alto índice de mortes de motociclistas uma vez que a vida deles dependia única e exclusivamente da habilidade e das ações dos outros motoristas. Imaginem casais sobre uma pequena motocicleta dirigindo ligeiros entre caminhões de 30 metros de comprimento, carros e ônibus?

Por falar em estradas, eu nunca me esquecerei delas. As estradas brasileiras têm buracos que intimidam e eles estão justamente em todo lugar por onde você precisar passar. Ao atravessar o Estado de São Paulo em direção a Minas Gerais e em seguida ao Mato Grosso do Sul você depara com duas realidades bem distintas: as infinitas e caras praças de pedágio e a do completo esquecimento com estradas consideradas estaduais e completamente tomadas pela lama.

Foi com muito prazer que tive a chance de voltar ao ambiente acadêmico ao conhecer duas universidades importantes nas cidades de Piracicaba e Botucatu, ainda no Estado de São Paulo. O entusiasmo dos professores e o amor deles a seus alunos é algo imensurável e que não muda não importando o país. Os estudantes ainda possuem afiadas mentes questionadoras e olhos bem abertos como geração futura. Os prédios históricos, remanescentes da época colonial do Brasil quando as plantações de café reinavam, adicionam valor descomunal às universidades que visitei. Obtivemos a oportunidade de conversar com plateias de alunos e falar um pouco sobre o trabalho de melhoramento genético que é desenvolvido na Nova Zelândia. Foi uma experiência realmente muito boa. Ainda em visita às universidades e ao corpo técnico pude perceber o quanto pode ser feito em termos de pesquisa no Brasil. Minha mente era um ‘fervilhão’ de pensamentos e ideias a cada momento que passávamos com os professores e alunos. Apenas me surpreendi com o fato de que a universidade de Botucatu, estando em posição estratégica no Estado de São Paulo, preocupa-se com a produção de leite ovino quando o futuro para a ovinocultura no Brasil será sempre a produção de carne.

Agora vamos falar finalmente sobre a indústria ovina no Brasil.

Depois de ter visitado muitas propriedades, ter conversado com representantes de frigoríficos, acadêmicos, produtores de ovinos, consultores técnicos e entusiastas da ovinocultura muitos questionamentos ainda me tiravam as poucas horas de sono que tínhamos durante aquelas 3 semanas viajando por quatro estados diferentes do Brasil. Se a carne ovina está em clara falta no mercado brasileiro, por que não há uma indústria próspera?

Tomem como exemplo duas afirmações que anotei:

“Nós precisamos de mais carne de cordeiro; nós não conseguimos comprar o suficiente ainda que nossa necessidade seja imediata.” – gerente de uma rede de hipermercados da cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

“Os consumidores pagariam mais por uma carne de cordeiro de qualidade se houvesse disponibilidade.” – proprietário de uma loja de carnes de Botucatu, São Paulo.

Com 15 milhões de cabeças de ovinos não é surpresa alguma que 90% da carne ovina inspecionada no Brasil seja oriunda do Uruguai, não havendo outra fonte sustentável. No entanto, é sabido que apenas 1 milhão de toneladas de carne ovina seja comercializada internacionalmente por ano. O mundo está em falta desta e assim o estará para sempre.

A indústria ovina brasileira demonstra não ter foco. Com uma população de quase 200 milhões de habitantes o marketing da carne ovina deveria ser bem lucrativo e para a opinião desse produtor aqui não há necessidade de substituir o produto uruguaio basta apenas valorizar o produto brasileiro com qualidade e melhor apresentação, proporcionando cortes frescos ou resfriados e preços atrativos ao consumidor final. Ações que nós neozelandeses aprendemos ao longo de todos esses anos: é o consumidor do seu cordeiro que dita as regras de produção.

A demanda se faz inversamente proporcional ao suprimento no Brasil. Em praticamente todos os estabelecimentos de comércio de carne que visitei foram unânimes as reclamações sobre consistência de oferta, uma vez que esta se faz crítica ao lucro durante a venda. Ficou claro para mim que os produtores brasileiros não entendem ainda que somente melhor genética produzirá melhor produto que, por sua vez, consolidará a especificação. Torna-se inútil, desta forma, a promoção da carne se a oferta é irregular.

O conceito de melhoramento genético para os produtores de ovinos brasileiros foi me apresentado quando visitei a grandiosa Feira Internacional de Caprinos e Ovinos na cidade de São Paulo. Imaginem um shopping de ovinos, um lugar que você passa o dia todo lá dentro, perdendo a noção do tempo em meio a animais sendo escovados, lavados, pintados e levados a arenas para serem julgados como se fossem modelos de passarela e leiloados como pinturas de Monet. Produtores neozelandeses, a que lhes lembra isso? Sim, parecia que eu tinha voltado 40 anos no tempo.

Das inúmeras conversas que tive por horas com os entusiastas da ovinocultura a mais difícil foi explicar que o reprodutor na Nova Zelândia não tem que ser bonito, ele tem que provar resultados; que uma vez que o cordeiro vai para o frigorífico ele passa a ser uma carcaça e é essa carcaça que traz o verdadeiro lucro da sua produção e não o comprimento da orelha. O reprodutor não tem que ter vida fácil, ele tem que ser capaz de cobrir 100 matrizes naturalmente para ser considerado bom inicialmente e o mais importante a progênie que ele deixa tem que crescer para atingir metas melhores do que o pai.

Ao ser questionado sobre o que eu achava do carneiro da fazenda dele, eu respondi ao criador que eu não poderia comprar reprodutor algum dele enquanto eu não fosse informado sobre o desempenho zootécnico daquele animal em termos de fertilidade, sobrevivência e taxa de crescimento, por exemplo. Contrariado com o desenrolar da conversa ele afirmou dizendo: “Ninguém vem a minha propriedade comprar carneiros e me pergunta sobre o desempenho zootécnico deles, mas sim quantas rosetas eles possuem.” Fato. Há muito o que se discutir sobre melhoramento genético no Brasil.

Em visita às propriedades eu pude aprender muito sobre diferentes regimes de alimentação que os produtores brasileiros proporcionam aos animais. Raças terminais como Texel, Hampshire Down, Ile de France, Poll Dorset e Dorper despontam na preferência dos criadores e são encontradas em várias partes do país por onde passamos. Há também uma raça nativa deslanada típica de regiões secas e com escassez de alimento, que eles chamam de Santa Inês, utilizada como linha materna e que me lembrou muito das que encontrei no Oriente Médio e em algumas regiões da China, um animal rústico mas sem aptidão para carne. Diversos tipos de solo e pastagem fazem do Brasil um potencial produtor de ovinos muito parecido com os nossos vizinhos australianos, no entanto, me admirei ao comparar o tamanho cuidado em acertar formulações de ração minuciosamente calculadas e estrategicamente fornecidas com o desconhecimento da importância do melhoramento genético como fator limitante à produção e, ainda mais, com o desconhecimento de cuidados elementares de manejo e sanidade. À medida que nos direcionávamos ao Sul, muito me recordava os criatórios do nosso país. Manejo extensivo, rústico, de muitas cabeças e sempre presente a quase nula informação de desempenho zootécnico dos animais.

O fato é que muito do que desenvolvemos aqui pode ser adaptado às condições brasileiras. A simples troca de ideias e conceitos sobre sanidade animal, manejo e melhoramento genético seriam o suficiente para um bom começo. Há ainda grande disparidade entre o produtor, técnicos, consumidor e frigorífico quando deveria haver coerência. O material genético adquirido por importação sofre um tipo de proteção monopolizada e super ostentação mesmo sem possuir dados comprovados de desempenho zootécnico. Os ovinocultores brasileiros desconhecem, infelizmente, o potencial que o país deles possui: a terra é farta, o grão é farto, o mercado é farto, e é por este motivo que a carne uruguaia ainda compete nas prateleiras.

Interessante me questionarem várias vezes sobre o nosso segredo. Isso mesmo, nós temos um segredo e para isso convidei todos os meus anfitriões a vir nos visitarem e descobrir o tal segredo. Na ânsia por uma resposta eu apenas afirmei: ‘nós não criamos ovelhas, criamos pasto. A ovelha é apenas o produto dentro das nossas limitações.’ E, assim, mais uma noite perdida de sono.

Não há como não se entusiasmar com a alegria e a determinação do ovinocultor brasileiro e não acredito que o potencial produtivo do Brasil seja uma ameaça ao nosso mercado. Acredito sim, que podemos guiá-los por meio dos nossos exemplos para que possam se tornar mais eficientes e, desta forma, ajudar-nos a alimentar o mundo.

O Brasil é, absolutamente, inacreditável. Mal posso esperar pela minha volta ao país.

Notal final aos leitores:

(1) Eu gostaria muito de ser proprietário de pelo menos um dos pedágios das rodovias de São Paulo.

(2) O Uruguai não competiria nunca se algumas áreas de plantações de cana-de-açúcar em São Paulo fossem convertidas à ovinocultura.

Um comentário

  1. Sérgio Murillo Freire Barbieri

    Muito bom, gostei e acho que o resumo é “Não criamos ovelhas, criamos pasto”, parabéns!!

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